Hermes, um dos líderes da Axiquara que nos recebeu, aborda o tema das plantas medicinais e da medicina bioenergética.

Uma coisa que ninguém está falando é a medicina alternativa, quer dizer, as coisas naturais que nossos pais usavam. Eles só se curavam com as coisas da natureza. Isto está voltando. Em vez de comer para se alimentar, a gente está prejudicando a nossa vida.

O médico não adivinha o que você tem. Ele tem que fazer exame para saber o tratamento que tem que dar.

Aqui, eles [as pessoas que usam as curas bioenergéticas], só com a energia que eles sentem das pessoas, eles sabem que doenças tem e, aí, indicam o tratamento. Com o tratamento bioenergético não tive mais problema. Só no caso da próstata é que tive que ir para Belém, mas mesmo para isso, o acompanhamento, faço com o tratamento bioenergético. Minha pressão ia a 22: fiz o tratamento com eles e não preciso mais controlar com químicos, só com o bioenergético.

Para o vitiligo, ia para Belém de 2 em 2 meses. [O médico] não passou um remédio, a única coisa que passou foi uma preparação. Aí, chamei a doutora, perguntei porque tinha aumentado. Ela disse “câncer de pele”. Mas estou bem com o tratamento bioenergético.

A medicina vem da natureza. A fábrica pega da natureza. Mas o remédio é uma coisa química.

Aproveitamos, então, para conhecer Arlete, uma das líderes da comunidade, que, numa longa conversa, nos explicou como funcionam os tratamentos bioenergéticos que pratica há muitos anos.

Me formei nos tratamentos bioenergéticos em 1995. Mas eles chegaram no Brasil em 1993.

Começou assim: O Paulo, da FASE, insistiu para que eu fizesse uma campanha com a medicina natural, com o grupo de mulheres. Fizeram um panfleto, mas não chegamos a ter um projeto. Trouxeram uma mulher para fazer um curso, eu nem pude participar, porque estava estudando no Gavião II[1] para ser professora.

Mobilizamos em vários municípios: aqui, Açailândia, Altamira, etc. Antes, eu trabalhava sem diploma. Aí, fui a Belém para fazer o curso, de 3 ou 4 meses. Era uma freira de Cuiabá que veio fazer este curso em Belém.

A primeira formação legalizada no Pará, foi em Gurupá. Hoje, a família toda está trabalhando com isso. Um filho se cansou de trabalhar com gente e está trabalhando os tratamentos bioenergéticos om os animais e as plantas. Funciona igual.

No começo, usávamos um ferrinho para descobrir o órgão doente, que doença é, etc. Mas o ferrinho passa muita energia negativa para nós. Nem usamos mais. Na alopatia, precisa de 10.000 células para detectar a doença, nos exames. Com o bioenergético, basta uma. Ele é um exame preventivo. É como uma antena.

Os remédios funcionam de forma diferente de acordo com a pessoa. A mesma doença não tem sempre o mesmo remédio.

Tive uma consulta, faz uns dias, com uma criança. Receitei uma defumação com umas plantas. Vão voltar depois de amanhã para eu avaliar. Vem gente de tudo que é canto consultar: Altamira, Macapá, Belém, Melgaço… Ficam internados aqui até eu dar alta.

Em 1999, a gente cuidou de uma pessoa com HIV. Veio aqui um: descobriu que tinha o vírus, nem foi ao médico, veio aqui direto. Está vivo até hoje.

Mas comecei a ver que tinha recaída: a pessoa voltava aqui com o problema. Aí, vi que tinha outro problema: nosso corpo não é feito só de matéria. Mas, fazer uma defumação, ou ver a parte espiritual, é como ser macumbeira, me incomodava. Então, eu mandava para o benzedor.

Tinha dificuldade de examinar pessoas da família, pai, mãe, filho. Minha filha teve uma hemorragia. Fui na cidade e ia embora, mas meu irmão me disse ‘não vá, hoje você tem uma coisa que descobrir para alguém’. Aí, eu me lembrei da minha filha. Aí, fui examinando, fiz um desenho de uma garrafa, fiquei examinando quantos ingredientes ia por, comecei a fazer a lista, mas faltava um ingrediente. Ele disse: ‘se achar, você pode ir’. Aí, achei o último ingrediente, mostrei para ele e ele disse ‘é isso!’. Eu não sei o que ele sabe, ele não sabe o que eu vou achar, mas quando eu acho, ele sabe que está pronto.

Tem a coisa espiritual que é mais complicada. Fui no Jocojó. Uma amiga tinha me convidado para ver a casa dela. Tinha uma sobrinha com tosse, garganta entupida, ouvido que vazava, às vezes fechava para respirar. Tomava chá e banho de tudo o que é coisa, mas não dava conta. Tinha um monte de garrafas em baixo da rede da menina. Aí, examinei ela e vi que era preciso 9 ingredientes. Começo com o mais complexo, depois vou para o mais simples. Receitei três defumações.

Foi a primeira consulta espiritual. Levou 15 dias para sarar. Ela não tinha dinheiro para pagar. Um tempo depois, chegou um fardo de farinha. Perguntei para o meu marido: ‘você encomendou farinha?’. Um mês depois, veio ela: nem reconheci.

Teve outro caso. Vi que estava adoecendo a filha, o filho, o pai. A criança ficava dizendo para as pessoas “seu égua”, falando mal, agressiva. Eu percebi que tinha que tentar tudo. O pai tinha vontade de matar a filha, eu percebi. Falei com a filha, que tinha que tratar ele. Pensei que ele não ia querer fazer o tratamento, então propus fazer com a mãe.

Também veio uma mulher que era pagé, curandeira, que parou aqui e me pediu para dar um remédio, que ela estava doente. Tinha quase 100 anos. Eu disse: ‘vai para a tua banca, fazer as suas curas’. Ela voltou e viveu até os 108 anos.

Anderson, que nos acompanhava, testemunha:

Fui no rio e mergulhei. Começou um assobio no ouvido. Depois, começou a vazar. Fiquei meses tratando com anti-inflamatórios, remédios, lavagem. Aí, ela receitou um chá de casca de pau de mulungú e outras coisas. Sarei.”

Arlete, retoma o seu relato:

Estou no meio desse mato, mas pesquiso muito. Estou aqui sentada, mas meu cérebro vai longe.

Tinha a ABRASP – Associação Brasileira de Saúde Popular. Mas parei de cotizar, me afastei. Eu criava fórmulas e mandava para a Pastoral da Saúde. No final do ano, uma freira – filha da mãe – tinha um levantamento de tudo o que as pessoas faziam, quantos atendimentos, quantos potes vendidos, todas as receitas dadas, etc.

Mas percebi que a gente mandava os potes para elas e elas vendiam em pequenos vidros, em grande quantidade. Ela vendia o livro de receitas coo se fosse dela. Ela conseguiu projetor, carro, com este dinheiro.

Eu mandava com etiqueta “Tintura Arlete”, elas trocavam o nome e chamavam “Tintura CHPU”, que era a que mais vendia. O meu rejuvenescedor, ficou com outro nome. Também vendia muito. “Ela substituiu o barro, para tirar as amebas, vermes da cabeça, porque na cidade não dá para ter barro.

Esta freira queria punir as pessoas que punham nome no remédio. Chegou até a citar meu nome numa assembleia com 500 pessoas. Tive que responder: ‘Você poderia ter feito a ‘Tintura Irmã Hélia’, não fez porque não quis.’”

Nota

[1] Projeto de extensão da UFPA – Universidade Federal do Pará, que formou professores leigos, de nível Magistério, para atuar no Ensino Básico.